domingo, 25 de outubro de 2015

"À pala de Lisboa", uma não geração, nem triste nem alegre.


                                                 Sena da Silva - uma retrospectiva" Serralves 1990

No catálogo Sena da Silva - uma retrospectiva Serralves 1990, dois textos do fotógrafo.

«A exposição de fotografias de Gerard Castello Lopes em Lisboa, leva-me, pela primeira vez, a falar de "geração"». Sena da Silva, NOTAS PARA UM RETRATO, (texto originalmente publicado a propósito da 1ª exposição de  Gerard Castello Lopes na ether, no jornal de letras em Janeiro de 1983). Aqui se faz referência ao livro Lisboa Cidade Triste e Alegre de Vítor Palla e Costa Martins.

E a mim leva-me a falar de Sena da Silva e José Cutileiro (alguns confundem com o irmão João Cutileiro, escultor, José é antropólogo, autor do livro Ricos e Pobres no Alentejo, Oxford Press 1973), decidem aproveitando o apoio de editores suíços produzir um livro de fotografias sobre Lisboa, fotografias de um e poemas do outro com texto em françês, (projecto que nunca viria a ser concretizado). Durante semanas deambularam por Lisboa procurando imagens "em resposta ingénua ao desafio de um fotógrafo pouco célebre", Cartier Bresson.

"Ignorávamos então, que nessa mesma altura,(1957 e 1959), começavam a andar pela mesma cidade Vítor Palla e Costa Martins (relembrados pela ether em 1982), com muito mais bagagem do que nós em todos os aspectos..".

Sena da Silva considerava o conceito de geração cronologicamente escorregadio e eticamente perigoso, admite no entanto que na época ignorava praticamente tudo em relação à fotografia, mas tanto ele como todos os seus amigos e colegas de curso na ESBAL, queriam manter longe o espírito bafiento, das provas tecnicamente perfeitas e esteticamente enquadradas do Salonismo.



                                                     Fernando Lemos, 1949

Os anos cinquenta tinham iniciado com uma rejeição do escasso público de fotografia existente em Portugal, Fernando Lemos , surrealista fotografo e artista plástico, tinha então, numa mostra inovadora sido praticamente ignorado. Num panorama onde imperavam os clubes e salões, estilos tecnicistas, imagens a cor efeitos de luz desaguavam em postais ilustrados de sabor turístico.

"imagens do Povo Português: pescadores da Nazaré, gente das vindimas do Douro em artísticas fotografias de Rollei do Senhor Artur Pastor e..."

Acontecia por ironia, que Sena da Silva ( e também Gerard), não tinha meios próprios de revelação e  impressão tinham por isso de partilhar no laboratório dos armazéns do Chiado, os líquidos da mesma tina com obras "dos distintos amadores do Foto clube 6x6, do então semi-profissional Artur Pastor e do inspector Rosa Casaco da PIDE". Podendo assim concluir pela grandeza do meio fotográfico da época, e pela relativa  e incomoda distância que uns e outros mantinham entre si.





Vítor Palla e Costa Martins eram nos anos quarenta dois estudantes de arquitectura que sem dinheiro para viajarem, mas suficientemente informados dos que se passava "lá fora", registaram em cerca de seis mil negativos, dos quais seleccionaram duzentos, para o que é considerado um foto-livro de referência no Portugal pós guerra, imagens foto-poéticas duma Lisboa periférica no panorama das capitais europeias. Lisboa, Cidade Triste e alegre (1958), exercício quase antropológico de uma vivência directa com as pessoas numa poética inspirada na frase de Fernando Pessoa e que devia por outro lado muito à linguagem do "cinema novo", paixão pela cidade, onde captam imagens ora claras ora escuras, desfocadas, tecnicamente longe do esteticismo calculado dos salões, livres de regras e constrangimentos, afastadas da "ditadura da felicidade" da  propaganda do estado novo, e da imagem das comédias populares do cinema dos anos quarenta.
Como escreve Maria do Carmo Serén  no seu livro A FOTOGRAFIA EM PORTUGAL  Fubu ed. SA 2009, "na captação de imagens, onde misturam abordagens que apenas se encontravam já nas imagens londrinas de Robert Frank, em Walker Evans, William Klein, em certo Brassai nocturno no Van der Elsken que também acabara de surgir- indicativos dispersos de que a fotografia internacional não cabia toda no humanismo que a Magnum especializara com Cartier-Bresson e o seu momento decisivo e sujeitava a interpretação e a estética do mundo entrevisto ao olhar do fotógrafo."
Vamos ver que a cumplicidade entre fotógrafos juntava muitas vontades, mas não era um olhar sociológico, anuncia antes uma reflexão sobre o papel plástico da fotografia.

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