quarta-feira, 17 de junho de 2015

M.Aldegalega, Avenida 5 de Outubro, 88 Setúbal, história duma fotografia.

A fotografia é algo contingente no processo de construção da memória, espécie de peça, solicitação ou pré-texto, estabelecendo a possibilidade de diversos movimentos de recordação.



Como indica o título a fotografia foi tirada em Setúbal, na casa M.Aldegalega, (talvez uma referência a Aldeia Galega, actual Montijo), e tem no verso uma data, (8/18), o dia não consta mas ficamos assim a saber que foi no mês de agosto de 1918, o ano em que terminaria a 1ª Grande Guerra. Figuram nesta fotografia um grupo de três mulheres e três homens, dois sentados talvez de estatuto mais importante e atrás de pé os restantes, um homem em pé entre as mulheres.
Esta fotografia foi-me dada quando a minha tia Manuela, moradora à data da sua morte em Sines, por uma senhora sua amiga de longa data, que me perguntou se eu queria ficar com alguma coisa dos seus parcos haveres deixados de herança, respondi que só queria as fotografias que houvesse, e assim entre outras estava esta. Nelas com segurança identifiquei a minha avó materna, Maria da Silva Moço, aquela por detrás do seu primeiro marido, sentado de fato preto. Devia à data ter dezanove anos pois nasceu em Sarilhos Velhos em 1899, e casou em primeiras núpcias com aquele senhor que nunca soube o nome, proprietário de uma pequena quinta em Azeitão, e de uma taberna em Aldeia de Irmãos, na berma da estrada que segue para o Portinho da Arrábida. Enviuvou com 22 anos, consequência da morte do marido vítima de tuberculose, deixando-lhe dois filhos pequenos, a minha tia Manuela Moço, e José Moço um rapaz mais novo, e ficou a explorar a dita taberna, onde vendia vinho e fruta da serra da Arrábida.
Julgo que como era já relativamente vulgar na época da democratização da fotografia, pretendia assinalar um qualquer evento familiar e privado. Estavam todos vestidos certamente com as melhores roupas que possuiam, e de pose séria e orgulhosa, estática como era da praxe fotográfica e da exigência das limitações técnicas. As mulheres das duas extremidades esquerda e direita têm a mão pousada nos respectivos esposos, deduzindo dai que o homem de pé e o único de bigode esposou a mulher que está a seu lado, três casais portanto, que num acto comemorativo, se deslocaram ao estúdio de fotografia, para serem fotografados e assim realçarem e registarem para o futuro a sua relação civil. Lembro ainda (ou julgo ter ouvido) a minha tia ter dito que o primeiro marido da minha avó teria três irmãos, e assim esta fotografia, marcaria solenemente o seu casamento com estas três jovens, que assim legitimavam pelo casamento.

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