terça-feira, 26 de maio de 2015

A assimilação da fotografia

Embora a fotografia não matasse a pintura nos anos seguintes a 1839, alguns tipos funcionais de pintura declinaram ou desapareceram, como a de retratos em miniatura, cujos executantes se apressaram a passar para o campo da fotografia comercial, abrindo lojas.

Nas quatro décadas seguintes (1840-80), profissionais e amadores, um pouco por todo o mundo, experimentaram com uma rapidez incrível, papéis, lentes e mecanismos, produzindo milhões de imagens, e no meio de tanto entusiasmo em captar o visível, poucos foram os que conseguiram imagens que pudessem reclamar para si o estatuto de belas artes. E no debate que se seguiu sobre ser ou não a fotografia "arte", ambos os campos do contraditório usaram as mesmas polaridades do discurso tradicional sobre arte.

Arte versus artesanato ou trabalho manual, artista contra artesão, intelecto opondo-se a mecanismo, imaginação a habilidade manual, estética por um lado, instrumentação por outro, original, obra única versus múltiplas cópias.

O argumento mais contundente contra a fotografia como uma das belas artes partiu de Lady Estlake em 1857, e o mesmo tipo de razões foram sendo ciclicamente reciclados a partir de Boudelaire em 1859, Santayana e Croce, até ao fim do séc.XIX.
Lady Estlake admitia na fotografia a sua capacidade para a definição e reprodução, chegou mesmo a sugerir que a fotografia podia libertar a pintura de alguma escravidão processual, a imitação.
O artista executava seguindo a liberdade de escolha e a inteligência, enquanto o fotógrafo obedecia simplesmente a um  puro mecanismo. Uma outra razão que impedia a fotografia de ser uma das belas artes era a sua submissão a fins práticos. Os desejos de arte residia para Lady Estlake, numa pequena minoria, enquanto o desejo de factos acessíveis e baratos, embora correctos, residia numa maioria.

Do outro lado do canal Boudelaire criticava o publico em geral por preferir na pintura a exacta imitação da natureza e a fotografia ser uma narcisica arte, que contemplava a sua trivial imagem reflectida na superfície do lago,  mas desta vez na de metal dos daguerreotipos. Honoré Daumier por sua vez caricaturava a fotografia, no seu desenho de Nadar, a fotografar Paris a bordo do seu balão, cá em baixo, todos os edifícios exibiam a palavra photografie, estampada nas fachadas.

O debate havia de se prolongar pelos setenta anos seguintes, sempre entre estes dois pólos, arte versus artesão, intelecto versus mecanismo.

Alfred Stieglitz põe por fim um ponto final na inútil questão, para ele a fotografia, era um processo plástico, e não um frio e mero registo mecânico, no entanto na mão dum artesão podia ser tão limitado, como os pincéis de pintura, na mão de um banal copista.

Depressa surgiram "campeões da arte fotográfica", interessados sobretudo em subtrair a sua produção, através de "qualidades invulgares", da massa dos fotógrafos ordinários.

Julia Margaret Cameron estava entre aqueles que aspiravam a enobrecer a fotografia, assegurando para ela o carácter e usos da "alta arte", usando deliberadamente nos seus retratos uma idealização da luz e uma desfocagem, "blur".
Oskar Rejlander e Henry Peach Robinson usavam por contraste, negativos múltiplos, e faziam composições sofisticadas, cuidadosamente simbólicas e com narrativas que faziam lembrar os pré rafaelitas, seus contemporâneos.

Mas havia de ser o "pictorialismo" como movimento, com as suas cenas impressionistas, de focagens suaves, e poses estetizadas, que tiveram mais sucesso, na tentativa de ganhar respeito, em prol duma fotografia como um medium artístico e do fotógrafo como um artista.



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