quinta-feira, 28 de maio de 2015

O Daguerreótipo por Edgar Allan Poe (1809-1849)

Ao contrário de Boudelaire, cuja obra influenciou, Edgar Allan Poe prestou homenagem à invenção da fotografia como «o mais importante e talvez o mais extraordinário triunfo da ciência moderna». Em 1840, publicou três artigos acerca da fotografia:«O Daguerreótipo» surgiu na edição de 15 de janeiro da revista Alexander´s Weekly Messenger, e os outros dois, sobre os aperfeiçoamentos do daguerreótipo, nas edições de Abril e Maio da Burton´s Gentleman Magazine. Poe e o seu contemporâneo Nathaniel Hawthorn viam a fotografia como uma invenção representativa do potencial «miraculoso», ou mesmo mágico, da era moderna. Tal como muitos homens da sua época, Poe deleitava-se com aquilo que considerava a precisão mágica da imagem fotográfica.O seu fascínio com as fotografias não se baseava tanto nas origens mecânicas das imagens quanto nas origens  que se revelavam mágicas. Muitas invenções científicas da época pareciam de certo modo miraculosas ao público em geral, e Poe apresentava a fotografia como representativa de todas elas. Acreditava que os resultados da maioria das invenções científicas iriam exceder as mais fantásticas expectativas dos mais imaginativos, e considerou que essa seria igualmente a regra para a fotografia.



"O nome deste instrumento é daguerréotype, e pronuncia-se como se a palavra  se escrevesse «daguêrréôtipe». O nome do seu inventor é Daguerre, mas as regras da língua francesa exigem o acento no segundo e na formação da palavra composta. O aparelho em si deve ser considerado, sem margem para dúvidas, como o mais importante, e talvez o mais extraordinário, triunfo da ciência moderna. Não dispomos aqui de espaço para nos debruçarmos sobre a história de invenção, cuja ideia original provém da câmera escura, e inclusivamente dos processos de fotogenia (termo derivado das palavras gregas que significam pintura solar) são demasiado longos para o nosso propósito presente. Contudo, podemos dizer, resumidamente, que se prepara uma chapa de cobre, expondo uma superfície que se possa conceber à acção da luz.  A chapa é muito bem polida com uma pedra calcária  esteática (chamada daguerreolite), contendo esteatite e cal em partes iguais, e ioda-se a superfície lisa colocando-a sobre um vaso contendo iodo, até adquirir, em toda a sua extensão, uma cor amarela pálida. Seguidamente deposita-se a chapa numa câmara escura e orienta-se a objectiva para o objecto que se pretende representar.A acção da luz faz o resto. O espaço de tempo necessário para a operação varia com a hora do dia e o estado do tempo (de um modo geral, entre dez e trinta minutos), mas só a experiência indica o momento para se retirar a chapa.Quando esta é removida, num primeiro momento perece não ter recebido uma impressão definida, mas alguns processos breves revelam-na na sua beleza mais miraculosa. Não há linguagem  que consiga transmitir uma ideia exacta da verdade, isto já não parece tão maravilhoso quando pensamos que a origem da própria visão foi, neste caso o próprio desenhador. Se imaginarmos a nitidez com que um objecto é reflectido num espelho absolutamente perfeito, talvez nos aproximemos tanto da realidade  como por qualquer outro meio. Com efeito, a verdade é que a chapa daguerreotipada é infinitamente mais precisa na sua
representação do que qualquer pintura efectuada por mãos humanas. Se observarmos uma obra de arte comum com um potente microscópio, todos os traços de semelhança com a natureza desaparecerão, mas o exame mais minucioso do desenho fotogénico revela apenas uma verdade mais absoluta, uma identidade de aspecto mais perfeita com a coisa representada. As variações de sombra e as gradações de perspectiva linear e aérea são as da própria verdade na sua perfeição suprema.
Os resultados da invenção não podem ser vistos, nem sequer remotamente, mas toda a experiência em matéria de descoberta filosófica, nos ensina que nessa descoberta, é com base no imprevisto que temos de calcular em maior medida. Há um teorema quase demonstrado que diz que as consequências de qualquer nova invenção científica terão no momento presente, excedido em muito as expectativas mais fantásticas dos mais imaginativos.Entre as vantagens que decorrem do daguerreótipo, podemos referir que, com o seu concurso, se pode determinar , em muitos casos, imediatamente a altura de elevações inacessíveis, pois permite obter uma perspectiva absoluta dos objectos nessas situações, e que o desenho de um mapa lunar correcto será realizado com facilidade, uma vez que se descobriu que os raios deste astro impressionam a chapa".


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